Está nos noticiários desta quinta-feira (30): cerca de 70% dos estudantes que concluíram o ensino médio no país apresentaram resultados considerados insuficientes em matemática e em língua portuguesa, não tendo aprendido nem mesmo o que é considerado básico. Os dados são do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e foram apresentados pelo Ministério da Educação (MEC).

Se os números demonstram que, sim, há um problema na educação básica no Brasil, há que se tomar cuidado com a forma como isso será — ou já é — tratado nas propostas eleitorais para o setor, sobretudo no que tange às candidaturas que representam a continuidade do golpe em curso no país desde 2016 e que atingiu fortemente as políticas educacionais.

Como destacou o coordenador da Secretaria de Comunicação Social da Contee, Alan Francisco de Carvalho, em artigo publicado na Carta Educação, o golpe trouxe a Emenda Constitucional 95 e o congelamento dos investimentos públicos no Brasil por 20 anos, inviabilizando o cumprimento do Plano Nacional de Educação (PNE) e da destinação de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para o setor. Trouxe também o desmonte da Petrobras e a entrega das reservas brasileiras aos interesses estrangeiros, que substituíram a destinação de 75% dos royalties do petróleo e do fundo social do pré-sal para o ensino público. Isso sem falar na equivocada reforma do ensino médio — que em nada dirime as dificuldades enfrentadas nesse nível de escolaridade, nem mesmo aquelas mostradas na frieza dos números — e na reforma trabalhista que contribui para a desvalorização e a desprofissionalização do magistério e dos demais trabalhadores em educação.

Na lista dos presidenciáveis, é esse o cenário representado por Henrique Meirelles (MDB) e Geraldo Alckmin (PSDB). Meirelles pode até ser oficialmente o candidato de Temer, mas, por sua coligação — que reúne o “centrão” apoiador e garantidor do golpe —, e pela própria trajetória tucana e seu pacto com as velhas elites, Alckmin também é apontado por grande parte dos analistas políticos como escolhido especialmente para esse papel. Fato é que, na educação, as propostas de ambos são bem próximas e apontam precisamente para uma leitura destorcida dos dados e de como investir em educação para de fato superar as desigualdades.

Meirelles, por exemplo, já declarou ser preciso valorizar a “meritocracia” e o “desempenho” dos estudantes, destacando inclusive que, se for eleito, vinculará os repasses do governo federal às escolas municipais ao desempenho delas – ou seja, quanto melhor for a nota nas avaliações, maior será o repasse. A falácia da meritocracia e a lógica da competição servem ao modelo do capital, que aproxima a escola de ume empresa. Acontece que uma avaliação de desempenho meramente numérica não leva em conta a base e a formação distinta de cada estudante, decorrentes das condições sociais das famílias e de suas possibilidades e capacidades em acompanhar a educação das crianças e adolescentes. Tampouco considera que a oferta de ensino é desigual, já que o próprio sistema educacional não é homogêneo, e que o modelo de uma suposta “igualdade de oportunidades” pode acarretar sérios problemas pedagógicos, aprofundando o abismo entre os “alunos bons” e os “alunos ruins”. Além disso, atrelar o investimento público ao “desempenho” da escola é ignorar também tanto a realidade da comunidade em que ela está inserida como a condição de trabalho a que seus professores e técnicos administrativos estão submetidos.

É esse mesmo pensamento industrial, contudo, que pauta o projeto de Geraldo Alckmin. Em sua gestão no governo paulista, por exemplo, o Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo (Idesp) era usado como critério para pagar bônus a professores e funcionários de escolas que alcançaram as metas fixadas para cada unidade. No entanto, ao contrário de uma melhoria de qualidade, o que a pressão sobre as escolas faz é levar a um estreitamento do currículo e a uma excessiva responsabilização do magistério, ignorando que há inúmeros outros fatores, sobretudo externos, que influenciam os resultados e vão muito além do empenho em sala de aula.

Apesar das críticas, esse viés mercadológico impregna o que está sendo e continuará a ser feito na educação caso o grupo que está no poder, seja com Meirelles ou com Alckmin, permaneça. Não é à toa que o tucano elogiou publicamente a reforma do ensino médio do governo Temer. Na teoria, o candidato diz que a medida foi feita de forma correta para evitar a evasão escolar ao dar a possibilidade de os estudantes escolherem os cursos, sendo esse um grande passo para universalizar o acesso à educação básica. Não vai e não é. A manutenção de apenas português e matemática como disciplinas obrigatórias não vai sanar as dificuldades dos jovens nesses conteúdos. Pelo contrário, instituirá um ensino embotado e sem abertura ao pensamento.

Como destacou a coordenadora-geral em exercício da Contee, Madalena Guasco Peixoto, em artigo também publicado na Carta Educação, a adoção de “áreas de conhecimento”, sob a pretensa alegação de reduzir o conteudismo, visa a, na realidade, excluir do currículo a reflexão e a formação crítica. Além disso, a suposta criação de cinco itinerários formativos, que seriam áreas de aprofundamento à escolha dos estudantes para cursar 40% do currículo, cai por terra quando as escolas têm a obrigação de ofertar apenas um itinerário, restringindo as opções dos estudantes.

Em vez de flexibilização, exclusão.

Por Táscia Souza

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