José Geraldo Santana sobre a sustenção financeira dos sindicatos
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José Geraldo Santana sobre a sustenção financeira dos sindicatos

Ao abraçá-los (as), cordialmente, peço-lhes permissão para apresentar-lhes algumas reflexões sobre o financiamento das entidades sindicais, que, por certo, se lhes apresenta como sendo o seu maior desafio, no momento,  em decorrência  da teratológica decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) proferida, nas sessões dos dias 28 e 29 de junho último, na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) N. 5794 e na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) N. 55, que visavam a inconstitucionalidade dos Arts. 545, 578, 579, 582, e 602, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a primeira, e, ao oposto, a sua constitucionalidade, a segunda; tendo esta sido vencedora, por 6 votos a 3.

O STF, com essa famigerada decisão, criou um modelo sindical ímpar, no mundo todo, só se encontrando algo semelhante nos Estados Unidos da América (EUA), por deliberação da Suprema Corte, por 5 votos a 4, no dia anterior, ou seja, 27 de junho de 2018; decisão que balizou o primeiro voto divergente, dado pelo ministro Luiz Fux, que lhe teceu loas e reverências.

Este monstrengo sindical assenta-se na unicidade sindical, com representação obrigatória de toda a categoria, com benefícios iguais, para associados e não associados (Art. 8º, da Constituição Federal (CF). Porém, com financiamento obrigatório para os associados e facultativo, para os não associados, residindo nessa quebra do princípio universal da isonomia a teratologia e a injustiça- ou indecência? -, da impugnada decisão.

Antes de propor-lhes as citadas reflexões, sinto-me tentado a dizer-lhes uma palavra sobre credulidade que, ao meu sentir, acaba por pautar o cotidiano de muitos dirigentes sindicais e advogados, sinceramente comprometidos com as causas dos trabalhadores; sobretudo no STF. Ao longo dos meus longevos 66 anos, sempre procurei ser crédulo, por acreditar que a credulidade, em si, não é uma fraqueza, mas, sim, uma virtude. Todavia, quando ela se descamba para a crença cega, negando-se a dialogar com a realidade, como a vejo no contexto atual, converte-se em estupidez.

Me parece que é exatamente essa maléfica crença cega que vem norteando a conduta de muitas entidades sindicais e advogados que as assessoram, no que pertine à (de) reforma trabalhista; posto que se recusam a ler e a interpretar os sinais que escorrem do STF, quanto ao seu indisfarçável e espúrio conúbio com os interesses do capital. A ADI N. 5794 é prova inconteste dessa cegueira.

Lamentavelmente, colho de manifestações de sindicalistas e advogados, que respeito e escuto, que a vã crença no STF ainda não se desvaneceu. Continuam acreditando que eventuais ações de cobrança de contribuição sindical, lastreadas em decisão de assembleia geral de toda a categoria, serão vitoriosas.

Depois do que vimos e ouvimos, nas sessões dos dias 28 e 29 de junho último, receio que não haja a menor possibilidade de isto se concretizar. Não é demais lembrarmos que cinco, dos seis ministros que votaram pela constitucionalidade dos novos dispositivos legais que tratam da contribuição sindical, fizeram-no invocando o inciso V, do Art. 8º, da CF, que dispõe: “ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato”.

Para esses ministros, a cobrança compulsória de contribuição sindical, desprovida de expressa autorização personalíssima, viola o preceito sob destaque. Chego a recear que, se chamado for, o STF não reconhecerá legitimidade da assembleia, para esta finalidade, sequer para os associados.

Por isto, sem confrontar com os que pensam de modo diverso e rogando ao universo para que tenham razão, creio que as entidades sindicais não devam se iludir com tal possibilidade. Devam, sim, quanto à contribuição sindical, buscar as autorizações individuais, pari passu à intensas mobilizações, com vistas à alteração legislativa deste disparate. Aliás, como sobressai do venenoso voto do ministro Roberto Barroso, que disse constituir-se em obrigação do STF ser “autocontido, respeitando as escolhas legislativas”.

Creio que nesse mar tenebroso, que contém mais do que perigo e abismo- parafraseando o fenomenal poeta Fernando Pessoa, em seu belíssimo poema “Mar Português”-, a contribuição confederativa seja o caminho menos espinhoso, apesar de a Súmula Vinculante N. 40, do STF, reputá-la exigível apenas dos associados.

Vale ressaltar que o TST, neste ano, já homologou vários acordos coletivos que a preveem, para a toda a categoria; claro com o letal penduricalho do direito de oposição. Mesmo sendo inegável que isto é pouco, não se pode deixar de considerar que representa o abrandamento do seu famigerado Precedente Normativo (PN) N. 119.

Ademais, para fazer frente ao teratológico modelo sindical, criado a partir da comentada decisão do STF, acima comentado, estou convencido- contra os meus princípios classistas, dos quais decorre a minha concepção sindical-, que haverá necessidade de os instrumentos normativos de trabalho criarem exigências, até aqui inexistentes, para que os  trabalhadores não associados possam usufruir das garantias nelas asseguradas, sobretudo no que diz respeito às mais sensíveis, como a bolsa de estudo etc. Frise-se que esse espasmo de ideia não tem a pretensão de exclui-los dos instrumentos normativos; o que rasgaria as minhas concepções e desautorizaria a minha prática sindical de quatro décadas.

Visa, isto sim, a dar concretude à multissecular e universal bandeira do movimento sindical, desde os seus primórdios, e tão bem cantada e decantada na “Internacional Socialista”, segundo a qual não podem haver deveres sem direitos, tampouco direitos sem deveres. O que acaba de ser negado pelo STF, que, ao reverso, garante direitos sem deveres, aos não associados, e direitos, com deveres, aos associados.

Para além de tudo o que foi dito, antevejo que não haverá alternativa decente viável, sem que as entidades sindicais retomem o cotidiano leito do diálogo direto e franco com a categoria; não só pelos seus informativos, mas, antes, com os insubstituíveis apertos de mãos e olhar nos olhos, dos quais jamais deveriam ter se afastado.

Reputo, ainda, como pertinente e necessária a inauguração de complexo e, até agora, adiado diálogo entre as entidades sindicais, no âmbito dos profissionais da educação escolar (Art. 206, inciso V, da CF), sobre a possibilidade e a conveniência de eventuais fusões entre Sinpros e Saaes; bem assim, entre federações.

Vejo-me compelido a afirmar que, no seio da Contee, no contexto atual, por razões alheias à sua vontade e até por cultura sindical, as únicas federações que, efetivamente, conseguem cumprir o relevante papel político-sindical de articulação dos sindicatos de sua base, para a atuação conjunta e una, no plano das negociações coletivas, são a Fepesp – com maior dimensão e densidade – e a Fetee Sul. As demais, em que pese a sua importância política, que é inegável, ainda não conseguiram fazê-lo. Antevejo, para breve, a extinção fática- talvez seja mais apropriado dizer sobrestamento fático – das federações, notadamente as que dependem quase que exclusivamente do percentual advindo da contribuição sindical.

Caríssimos (as), não pretendo dar nenhuma publicidade a essas reflexões – melhor seria dizer angústias -, se assim posso denomina-las; pretendo tão-somente compartilhá-las, para, quem sabe, nos anteciparmos aos espinhosos debates que se travarão, nos próximos tempos, a começar pela reunião da Diretoria Plena, com a participação de entidades que não a compõem, marcada para os dias 26 a 28 de junho corrente.

Ao debate!

Cordialmente,
José Geraldo de Santana Oliveira, consultor jurídico da Contee

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